domingo, 1 de fevereiro de 2009

Introdução à literatura grega

Os conceitos clássicos, os motivos e os parâmetros que a civilização ocidental adotou como seus estão combinados (...) na literatura grega.
Mary Ellen Snodgrass, 1988.

O poeta e crítico literário Ezra Pound (1885/1972) escreveu, certa vez, que literatura é "linguagem carregada de significado" e "novidade que permanece novidade". As mais importantes obras gregas, indubitavelmente, se ajustam com perfeição a esses conceitos: sua estética tem sido admirada e imitada há quase três mil anos e podem ser lidas e relidas várias vezes sem perda de interesse.

A literatura grega é a mais antiga da Europa e abrange um longo período de quase doze séculos — de -750 a 400, mais ou menos, sem contar a produção do Período Bizantino. Infelizmente, a maior parte foi perdida em consequência do fim do Império Romano e da quebra da unidade cultural do Mediterrâneo.

De cerca de 400 peças de teatro das quais temos referências, por exemplo, para mencionarmos apenas as representadas em Atenas, durante os festivais dramáticos, conhecemos somente 45; de toda a poesia lírica, com exceção de Píndaro e Baquílides, restam apenas alguns poucos fragmentos.

Em outros gêneros literários a dimensão da perda é ainda maior, e há apenas um consolo: praticamente tudo o que restou é de primeira qualidade.

Referências:
Ezra Pound, ABC da Literatura, trad. A. Campos & J.P. Paes, São Paulo, Cultrix, 71995.
Mary Ellen Snodgrass, Cliffs notes on greek classics, New York, Wiley, 1998.


RIBEIRO JR., W.A. Introdução à literatura grega. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. Disponível em www.greciantiga.org/arquivo.asp?num=0713. Consulta: 1/2/2009.

Origem e evolução da língua grega e do alfabeto

O grego, assim como muitas outras línguas extintas e "vivas" da Europa e da Ásia Ocidental, faz parte da grande "família" das línguas indo-europeias. Ao lado do sânscrito, a língua grega é uma das mais antigas da família.

A família indo-europeia

As populações que hoje chamamos de "indo-europeias" chegaram ao sudeste europeu e à Ásia Ocidental no final do Neolítico ou no início do Bronze Antigo. A mistura entre sua língua, o indo-europeu primitivo, e a língua falada pelas populações locais[1] originou diversos idiomas. Alguns deles existiram somente na Antiguidade; outros existem até hoje.

Quando se diz que uma determinada língua é da família indo-europeia, significa que o vocabulário, a estrutura gramatical básica e outros fenômenos linguísticos têm grandes semelhanças entre si. Do ponto de vista do vocabulário, por exemplo, comprovar a origem indo-europeia de uma determinada língua é simples; basta comparar as palavras dos vocabulários.
Veja, abaixo, como a comparação entre a palavra "pai" em línguas "vivas" (grego, português, francês, espanhol, italiano, inglês, alemão) e em línguas "mortas" (latim e sânscrito).

grego - πατήρ
português - pai
francês - père
espanhol - padre
italiano - padre
inglês - fhather
alemão - vater
latim - pater
sânscrito - pitá

A despeito das variações fonéticas — /fa/, /pa/ e /va/, entre outras —, o parentesco é evidente.
Quem eram, exatamente, os
indo-europeus? Diversos conhecimentos sobre a cultura indo-europeia antiga foram recuperados a partir do estudo das línguas mais velhas da família, mas ainda não foi possível atribuir nenhum achado arqueológico ao hipotético povo indo-europeu original, antepassado dos demais.

A origem do grego antigo
Alguns eruditos acreditam que em tempos remotos, talvez por volta de -2200, existia um único dialeto, o grego comum, do qual os demais derivaram; outros sustentam que nunca existiu, historicamente, um dialeto grego único. Um forte argumento a esse favor é o fato de que a cultura grega daquela época, resultado da mistura de diversas populações do Neolítico e da Idade do Bronze, era bastante diversificada.
A língua grega guarda resquícios dessa mistura populacional. Os filólogos detectaram, entre outras coisas, que certas palavras terminadas em -ssos/-nthos e usadas para nomear lugares são estruturalmente diferentes do padrão indo-europeu que caracteriza o resto da língua grega, e devem ter sido incorporadas antes de -2200: Tirintos (nome de cidade), Parnassos (nome de montanha), Kefissos (nome de rio)...

Os dialetos gregos

O termo "grego antigo" engloba, na realidade, diversas variantes dialetais: o micênico, o árcado-cipriota, o eólico, o dórico, o iônico e o ático eram os dialetos mais importantes. Sua existência está bem documentada durante o Período Arcaico e o Período Clássico, mas é altamente provável que esses regionalismos tenham se desenvolvido muito tempo antes.
O dialeto mais antigo deve ter sido, naturalmente, o correspondente ao grego falado pelos mínios durante o Heládico Médio, mas não há nenhuma prova disso. O mais antigo dialeto documentado por inscrições é o dialeto micênico (século -XV); o segundo mais antigo é, aparentemente, o árcado-cipriota, que tem vários graus de parentesco com o dialeto micênico. Devido à dominância econômica e intelectual de Atenas durante o Período Clássico, o dialeto ático difundiu-se por todo o mundo grego e os demais dialetos perderam progressivamente sua importância.
Durante o Período Helenístico, os gregos falavam já um dialeto "comum", conhecido por koiné (gr. κοινὴ διάλεκτος, ver D.H. Isoc. 2), derivado do dialeto ático. O dialeto comum, às vezes chamado de dialeto alexandrino, tornou-se a língua comum de todo o mundo mediterrâneo, helenizado pelas conquistas de Alexandre III da Macedônia, e foi utilizado durante muitos séculos, inclusive durante o Período Bizantino. O grego moderno deriva dele.

A origem da escrita


pictograma egípcio -2700/-2460
linear B micênico -1400/-1300

letras fenícias séc. -XI
Durante milênios, a língua grega era apenas falada e as comunidades que a utilizavam transmitiam oralmente os elementos culturais. Muito antes, no Oriente Médio, os sistemas de escrita haviam se desenvolvido desde o IV milênio a.C., e após alguns milênios essa importante inovação foi adotada pelos gregos.
"pictograma egípcio -2700/-2460 linear B micênico -1400/-1300 letras fenícias séc. -XI ". Os primitivos sistemas de escrita, usados pelos sumérios, acadianos, egípcios e outros povos, eram sofisticados e, ao mesmo tempo, complexos. Baseavam-se em grande quantidade de sinais pictográficos (ideogramas), e cada sinal representava tanto o objeto concreto como o conceito subjacente. O pictograma egípcio ao lado, por exemplo, era usado para representar tanto "escriba" como "escrita".
Os sistemas pictográficos orientais logo foram simplificados e surgiram os silabários, onde cada sinal representava o som de uma sílaba. Exemplos orientais são o hitita, da Ásia Menor, e a escrita linear A, de Creta. A primeira escrita da Grécia foi, exatamente, um silabário, conhecido por linear B. O sistema foi certamente desenvolvido pelos micênios, inspirados pela escrita linear A dos minóicos da ilha de Creta.
No Oriente Médio, por volta de -1700 (ou, talvez, -1900), apareceram as primeiras inscrições alfabéticas. Nesses primitivos alfabetos, como o proto-sinaítico e o ugarítico, cada sinal representava um som, mas somente os sons consonantais. Os intensivos contatos comerciais entre os gregos e os fenícios da sírio-palestina, no século -IX ou -VIII, ensejaram o contato dos gregos com o alfabeto consonantal dos fenícios.
Os gregos logo adaptaram os sinais fenícios aos sons de sua língua, e fizeram ademais uma importantíssima inovação: aproveitaram os sinais fenícios que "sobraram" e utilizaram-nos para representar os sons vocálicos. O alfabeto grego, plenamente desenvolvido no início do Período Arcaico, foi o primeiro "alfabeto verdadeiro", completo, com sinais que representavam tanto as consoantes como as vogais. Todos os alfabetos ocidentais, inclusive o alfabeto latino, que você lê neste momento, derivam dos primeiros alfabetos gregos.

RIBEIRO JR., W.A. Origem e evolução da língua grega e do alfabeto. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. Disponível em www.greciantiga.org/arquivo.asp?num=0044. Consulta: 1/2/2009.